quinta-feira, 5 de junho de 2008

Misticismo, Clube 27 e Experiência Psicadélica

As primeiras religiões surgiram nas civilizações primitivas que tinham acesso, por abundância endógena da região na qual viviam, a plantas alucinogénicas. Estas plantas possuem elementos químicos naturais que provocam um estado de realidade “alternativo”, em que o utilizador se sente (de forma geral) mais próximo de uma força ou poder superior.. Entendendo-se religião como conjunto de normas e rituais associados a uma crença, a preparação e consumo da substância em questão torna-se, então, o primeiro acto de cariz religiosa (daí a sua importância). Nessas civilizações, o acesso à sabedoria necessária para a preparação dessas plantas era controlado. Os Xamans transmitiam raramente o seu conhecimento a indíviduos demoradamente escolhidos. É necessário entender o carácter ritual e controlado deste fenómeno para ver as diferenças com a realidade actual e as suas consequências.

No entanto, e antes ainda de analisar o panorama actual, é necessário ver um momento intermédio decisivo. Esse momento corresponde à sintetização quimica do LSD por A. Hoffman em 1938. A sua banalização ocorre nos anos 60 e corresponde aos anos hippies. Esta substância torna-se rapidamente um estilo de vida idealizado por figuras míticas como Jimmy Hendrix, Jim Morrisson, Janis Joplin (Clube 27) e Miles Davis (que aos 27 anos também esteve à beira da morte). Neste momento, deu-se uma transferência da identidade Xamanica para essas figuras, que incorporam e transmitem melhor que nunca (com o aparecimento da electricidade na música) as experiências vividas sob efeito das drogas psicadélicas. Note-se que tanto Morrison como Hendrix se interessavam por esse rituais primitivos, o que também se alastrou, numa certa medida, aos ouvintes. Nesta fase, devido à elevada facilidade em adquirir e consumir esta droga, o consumo torna-se indescriminado e desmistificado.

Finalmente, nos dias de hoje, verifica-se o passo final da evolução do consumo de drogas. Banalizou-se o uso das designer-drugs, como ketamina, pastilhas e metanfetaminas, tremendamente noçivas ao nosso organismo e exponencialmente mais potentes do que as suas versões iniciais ou mesmo naturais (da folha de coca para a cocaína, desta para freebase e crack; de LSD para o MDMA, e finalmente pastilhas que contêm muitas vezes speed, extasy, e metanfetaminas). O mais importante neste passo final é o facto destas novas substâncias possibilitarem uma activação e multiplicação, de forma mecânica, de reacções naturais do corpo como a sensação de prazer. Por outras palavras, não é induzido uma alteração química mas sim uma estimulação de hormonas e neurotransmissores já existentes no nosso organismo, cujas reservas são finitas.

Os génios musicais actuais não são mais personagens partilhadas entre o prazer de viver e o êxtase da droga que lhes proporciona uma realidade alternativa, mas sim vítimas do suplício da dependência e pressão mediática. Bradley Nowelly e Amy Winehouse são bons exemplos disso, continuando musicalmente inconstáveis. No entanto, a identidade de Xaman desaparece e estes novos ídolos revelam-se ao público de uma forma mais crua. A magia perdeu-se, já não é credível queimar a sua guitarra em palco ou fazer solos de 30 min (como os Allman Brothers)...

Certo, Morrisson (e muitos outros) também esteve à beira da loucura, mas de forma diferente. O seu universo mental era vasto, complexo e extremamente rico... Os dois últimos quase só cantam a sua dependência, cruelmente illustrada nos médias mundiais (Youtube, Jornais, TV). Criou-se um novo culto. O culto do mórbido, resultado de um consumismo fanático...